Inativação parcial do blog e novo projeto

Por meio deste post venho anunciar a inativação parcial deste blog. É com um misto de pesar e nostalgia, pessimismo e otimismo que o faço.

Criei este blog, o “Tabula (não) Rasa & Libertarianismo Bleeding Heart”, em janeiro de 2013, com uma dupla missão: debater 1) a visão darwinista sobre o ser humano e 2) a posição “libertária bleeding heart” ou “liberal do Arizona” sobre a compatibilidade entre liberdade individual e justiça social, sendo o primeiro blog em língua portuguesa a endossar explicitamente essa posição filosófico-política.

Desde então muita coisa mudou, tanto internamente em relação aos meus conhecimentos e posturas, como externamente em relação ao modo como o debate público tem ocorrido.

Resolvi desativar parcialmente o blog (e abaixo explico melhor as implicações do “parcialmente”)motivado pelo fator externo: entendo que o blog foi criado pensado em e para circunstâncias muito diferentes de debate público.

No início de 2013, já era claro que a rede social facebook seria a principal plataforma para debates no contexto virtual. Toda a divulgação que fiz deste blog foi feita via facebook, por meio da página que ali mantenho. Portanto, o blog foi criado pensado para esse contexto de divulgação.

Ocorre que àquela época o facebook ainda não era usado intensivamente para viralização de conteúdos com base em clickbait, memes e “textões”, e o debate público mais amplo no Brasil ainda não era tão polarizado politicamente. Tais aspectos já ocorriam de vez em quando, mas a tendência para sua intensificação só ficou clara para mim muito posteriormente. Quando criei o blog, inclusive, não estava a par de muitos aspectos importantes, como a existência de um movimento liberal-libertário organizado incipiente (em contraposição aos sites de debate que eu sabia existirem, mas que não via como braços de um ativismo concreto) e de como certas questões caras ao debate sobre o darwinismo e o naturalismo eram tratados pelos sites dito “racionalistas” e “humanistas seculares”.

Infelizmente, na minha percepção, desde o final de 2014 (últimas eleições presidenciais) e a cada ano (2015, 2016) crescendo cada vez mais, o debate público no meio virtual deteriorou-se significativamente. Clickbait, memes e textões no facebook são a norma em termos daquilo que se pauta qualquer debate neste país. A polarização política cresceu vertiginosamente, dificultando o diálogo e incentivando um estilo polemista na comunicação de posições culturais e sociais.

O movimento liberal-libertário que eu conheci em 2013 como incipiente floresceu em termos de escopo e quantidades (e eu mesmo pude participar em alguns aspectos disso, por exemplo, como editor do Mercado Popular em 2014, agora Instituto Mercado Popular), mas certos aspectos problemáticos ainda não foram resolvidos ou significativamente melhorados (como uma influência conservadora muito grande em partes significativas dele). A própria percepção externa sobre ele agora está, ao que parece, irremediavelmente influenciada pelo clima de polarização,  ao ponto de ser creditado por alguns como tendo tido influência no próprio impeachment recente, por meio do Movimento Brasil Livre – e eu não considero essa organização um exemplo de liberalismo consistente.

Atualmente não participo formalmente de nenhuma de suas organizações, mas ainda acompanho parte dele, participo de algumas coisas ocasionalmente e estou alinhado com algumas iniciativas específicas mesmo estando longe do engajamento ativista – iniciativas mais relacionados com uma visão progressista do liberalismo. Meu perfil é muito menos o do ativista e muito mais o do acadêmico, e tenho preferência maior pelo debate – até por isso estou como moderador do “Esquerda Libertária – Left-Libertarianism”, único grupo de debate político de que participo ativamente no facebook.

A “memeficação” do debate virtual também afetou a discussão sobre a visão darwinista e naturalista sobre o ser humano. Por exemplo, certos discursos alinhados à esquerda que conflitam diretamente com a epistemologia de aderência à evidência científica cresceram nas redes sociais, por meio dos já mencionados “textões” e memes. Em reação a isso, surgiram páginas no facebook que visavam contrapor esses discursos, não negando a importância das lutas por minorias com os quais eles estão envolvidos, mas por defender a epistemologia erroneamente por eles rejeitada.

Contudo, a reação em alguns aspectos tem sido pior que o próprio problema que visou combater, disseminando uma visão rasteira e simplista tanto sobre a epistemologia da evidência científica, como sobre a significância e interpretação de achados científicos em áreas potencialmente (politicamente) sensíveis. Um exemplo disso são páginas que desqualificam todo tipo de feminismo que não seja o supostamente “racional”, definido restritamente para se encaixar numa só visão coincidentemente aquela dos administradores dessas páginas, ou que veem “pós-modernismo” em tudo  e são excessivamente preocupadas em testar a fidelidade “dos seus” contra o falso deus “pós-moderno” (quase um novo “perigo vermelho”!).

Como tudo isso afeta a divulgação deste blog? De uma forma bem simples. Quando eu divulgo um texto novo do blog pelo facebook, o título do site que aparece não é o “Tabula (não) Rasa & Libertarianismo Bleeding Heart”. É o “libertarianismoedarwinismo.wordpress.com”. No contexto atual, alguém ler logo de cara que o site por trás de um texto fala em “libertarianismo” e “darwinismo” já evoca todo um imaginário moldado por esse nosso atual estado de polarização que eu não havia concebido lá no início de 2013…

O fato é que eu errei: deveria ter colocado desde o início o nome do site de “Tabula (não) Rasa” apenas, e usado um link apropriado, como “tabulanaorasa.wordpress.com”. Eu não tinha muita ideia de como escolher nomes de site e como selecionar o link, então minha escolha não foi a melhor. Esse problema com o nome do site e com seu link não era grave ao tempo em que criei o blog, mas, agora, está em total falta de sintonia com o modo como o debate é feito nas redes. Colocar logo de cara essa identificação pode passar uma série de ideias equivocadas sobre seu escopo e posições.

Além disso, ao longo de sua história, o blog teve predominantemente textos de temática política, principalmente porque o ano em que fui mais produtivo na escrita de textos (2014) foi também o ano mais incomum, o que me engajei mais dentro do movimento liberal tentando influenciá-lo na direção mais progressista. Isso desbalanceou o tratamento dos temas e provavelmente afetou o padrão de acesso aos textos do site.

Então, é com base nesses motivos, que decidi pela inativação parcial desse blog. Esse é o aspecto negativo. Mas há um aspecto positivo: vou criar outro site, que se relacione principalmente com o projeto de mostrar como a visão de mundo naturalista pode e deve engajar-se com vários aspectos da filosofia analítica e das ciências empíricas (e mesmo do debate com a teologia). Em breve ele estará no ar, e – espero – será melhor organizado em torno de subsídios à visão naturalista filosófica e científica, e menos focado em política (enquanto essa não estará de todo ausente). O objetivo é que seja meu site pessoal permanente, para colocar alguns assuntos que eu esteja pesquisando ou lendo.

O blog atual ficará inativado apenas parcialmente, porque ainda vou republicar algumas coisas nele, seja que estavam em outros sites, seja textos que eu vou publicar no novo site, conforme eu considerar que seja interessante que esses textos estejam disponíveis aqui.

Meu muito obrigado a todos que acompanharam este blog e fizeram parte dessa história.

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